A insuficiência do processo civilizatório em condições não-mediáticas pressupõe uma série de imperativos sem os quais a lógica cultural do capitalismo tardio (JAMESON, 1997) não se faz mais possível. A experiência online retroage sobre a vida cotidiana off-line e reprograma dramaticamente os fluxos psíquicos, sociais, culturais, afetivos e sexuais, que passam a sofrer interferência direta das coordenadas ideológicas bem delineadas de oligopólios ciberculturais (da superfície e do submundo da cibercultura). Há uma sutileza neste processo de reprogramação psicossocial que não escapa à percepção dos fenômenos invisíveis da cibercultura.
Os oligopólios ciberculturais (da superfície e do submundo) operam sob dinâmicas próprias do ciberespaço para manter e ampliar sua base de usuários, valendo-se, para isso, da substituição estratégica de preferências originais por estímulos simulados e hiper-reais, que desembocam no consumo desenfreado e na liquidação dos sentidos (BAUDRILLARD, 1991), causando assim, a reprogramação do imaginário social (MAGOSSI, 2023). O fenômeno diz respeito a um marcador social de alta complexidade implicitamente ligado aos media e às redes digitais.
Em compasso histórico avançado em relação à temática, todos os acontecimentos se apresentam como modalidade da técnica (HEIDDEGER, 1958), calcada em resultados —custe o que custar para o ser humano. Evidências de época traduzem o cativeiro interativo da técnica. A saturação da interatividade em ambiente digital pressupõe violência. A violência invisível e simbólica caracterizam-se pela imposição da visibilidade mediática em todos os aspectos da vida contemporânea (TRIVINHO, 2007). Nessa armadilha, as condições do mundo do trabalho são transferidas para o mundo do lazer como se não houvesse outras formas possíveis de vida.
A domesticação psíquica (CHUL HAN, 2018) transforma o corpo em receptor da violência absorvida sem contestação. Caso haja reação, há punição. Isto é, perde-se o lugar ao sol na cibercultura — o que também não é garantia de nada além de likes e seguidores.
A lógica cultural do capitalismo tardio (JAMESON, 1997) se esfuma no processo de disputa das atenções. De acordo com Axel Honneth, em “The struggle for recognition: the moral grammar of social conflicts” (1995), o indivíduo é movido pela busca de reconhecimento tanto no contexto profissional quanto no pessoal. Nessa perspectiva, a luta pelo reconhecimento não gira em torno da validação das suas virtudes ou competências, mas da legitimação da sua existência pelo outro. Por isso, a sociedade civil cede às diretrizes ilógicas, sem questionarem, visto que a necessidade de pertencimento e validação dos pares é crucial.
No período em curso, a busca por reconhecimento permeia todas as condições da visibilidade mediática. Essas condições de época enquadram até mesmo o sorriso no arco de caracterização da violência invisível; parte de trabalho imaterial (GORZ, 2005). Nessa perspectiva, o sorriso é o modo de acontecer a compra na sociedade tecnológica atual. O status apresenta-se como valor de pertencimento social e o design se faz mais importante que a mercadoria.
Vive-se a roda-viva de signos deslocados dos seus significantes originais. A economia, a política, a sociedade, o afeto e a sexualidade, foram transformados em signos em formato de notícias, tweets, posts e memes que são repassados como estrato simbólico da cultura. Todos esses signos em forma de estrato simbólico da cultura possuem a ideologia violenta de grandes estruturas tecnológicas.
Com a razão desbodrada, reconhece-se que a espontaneidade está asfixiada. Identifica-se, assim, o domínio sutil das condições prévias para o modo de vida acontecer: subordinado à reprogramação algorítmica e ideológica de oligopólios ciberculturais (da superfície e do submundo do ciberespaço).