A série “Round6” da Netflix e a indústria adulta digital: da visibilidade à invisibilidade

Palavras-chave: Despatriarcando; round6; netflix, submundo
Ano: 2023

RESUMO:

Tanto o jogo da série sul-coreana da Netflix quanto as condições (mórbidas) de trabalho no submundo são “generosamente” oferecidos como a “última chance” por gente totalmente injusta, cruel e invisível, que lucra e se diverte com o extermínio da alma (alheia).

TEXTO COMPLETO:

Round6 é uma série sul-coreana da Netflix, lançada em 2021 e assistida em mais de 90 países. Entre os temas mais comentados na rede em articulação com a trama estão: a desigualdade social, a corrupção corporativa, a barbárie e a miséria existencial.

Já a indústria adulta digital configura-se como um submundo patriarcal, regido por grandes estruturas de poder, articuladas em regime de comunhão e organizadas em sites de pornografia, webcamming e packs eróticos.

De porte teórico, o texto apresenta uma crítica social sobre a expansão dos tentáculos do submundo na superfície. Objetiva-se defender o Estado de Direito dos mandantes e capatazes ocultos da indústria adulta digital que violentam a Constituição de 1988 por meio do simulacro de um “jogo de fantasmas embalsamados pacificados” (para evocar JEAN BAUDRILLARD em “Simulacros e Simulação”).

Em linhas gerais, tanto a trama da série sul-coreana Round6 quanto a dinâmica dos sites adultos ordinários — do tipo OnlyFans e afins — se resumem a uma competição de sobrevivência entre centenas de pessoas atraídas a participarem de jogos — organizados por proprietários ocultos — em busca de uma recompensa bilionária.

Assim como acontece na série, as vítimas da indústria adulta digital também abrem mão do direito à privacidade, dos nomes reais e da vida normativa em sociedade para se tornarem algoritmos em listas.

Em ambos os casos, toda atrocidade humana é anunciada como nada além de uma “brincadeira divertida” (Batatinha 1,2,3 x “empoderamento feminino”/ “empreendedorismo”), com “regras (nada) justas”.

Entre as injustiças, está o grande escolhido para não morrer simplesmente porque estava entretendo o proprietário do jogo com mais precisão. O mesmo acontece com o direcionamento do tráfego de usuários pela indústria adulta digital: recebe mais tráfego quem se submete a níveis mais profundos de desumanização, divertindo, assim, mais intensamente o dono invisível da empresa adulta.

Tanto o jogo quanto a atividade profissional são “generosamente” oferecidos como a “última chance” por gente totalmente injusta, cruel e invisível que soube calcular muito bem para quem condicionar um contrato leonino que exige a cessão dos direitos de tudo que importa na vida normativa em sociedade.

Os mandantes ocultos não apenas lucram à vontade com tudo isso, como se divertem com o sofrimento alheio.

Não é à toa que as jogadoras da indústria adulta digital estão concentradas em países da periferia do Capitalismo: Leste Europeu e América Latina. Nota-se que não é qualquer país periférico explorado por esse submundo. Interessa apenas aqueles em que o padrão mediático de “beleza feminina” é consumida pelo masculino tóxico.

Mesmo quando informadas, portanto, conscientes de tudo isso, a maioria das jogadoras optam por jogar o jogo da indústria devido a hipervulneravilidade financeira. Os proprietários do jogo sabem disso, obviamente. Assim, está inviabilizada qualquer tentativa de mudança de regras.

O jogo e a indústria desumana seguem por décadas sem chamar atenção do poder judiciário e das pesquisas científicas críticas em escala planetária.

Surpreendentemente, o jogo é ficção da Netflix. Já a indústria adulta digital inaugura a Era da Perversão interativa em tempo real.